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Armando Correa de Siqueira Neto*

Já fazia um bom tempo desde que eu deixara de ser aquela criança que, entre os livros e as muitas brincadeiras, olhava para o futuro e perguntava: o que eu serei um dia? Havia em mim a costumeira coragem do jovem que tudo pode mudar, e sem qualquer sombra de dúvida, seguia o meu caminho certo de que o tempo se encarregaria de apresentar todas as coisas boas da vida. Afinal de contas, eu era aquele que Deus escolhera para brilhar, tão certo quanto o sol que rompe a escuridão que antecede cada manhã. Eu era especial e carregava comigo tal convicção. Nada poderia atrapalhar tão abençoada jornada. Absolutamente nada! Até que…

Os anos se passaram e uma reviravolta medonha se deu em minha vida. As dificuldades chegaram bem mais pesadas do que supus com a minha ingenuidade e a falsa proteção que eu mesmo criei evitando enxergar a realidade. O emprego era uma tortura. O dinheiro nunca dava. Os estudos ficaram para traz. A esperança também. Até o tão sonhado casamento se mostrou trágico. Nada progredia, tudo falhava. Separação, tristeza, frustração, desespero e apatia pareciam ter entrado por cada poro do corpo e se instalado dentro de mim. Era o fim. Eu já não acreditava em mais nada, havia me tornado o parceiro do azar, e nem as mais simples expectativas se concretizavam. Olhava ao meu redor e me enraivecia ao ver as pessoas felizes, cercadas por suas famílias e protegidas pelas suas casas bem decoradas. Perguntava-me: onde estaria Deus, que me prometera igual cuidado tempos atrás? A única resposta que encontrava era: “Fui esquecido! Completamente.” Até que…

O tempo prosseguia teimoso e eu me atemorizava com a ideia de que envelheceria daquele jeito, sem eira nem beira, um pobre diabo. Bastante deprimido, passei a desejar a morte, através da qual me livraria do suplício que se enraizara no fundo da alma. Não fui corajoso o suficiente. Mas, por outro lado, comecei a me perguntar: “Por que eu não acabava com tudo simplesmente, tendo em vista o panorama tão sombrio?” Obriguei-me à reflexão. Foi ai que despertei para a vida, ao compreender que havia uma esperança maior dentro de mim, até então ignorada, a qual me impedia de encerrar algo que mal acabara de começar. Descobri também que tal esperança era exigente, pois eu teria que mudar radicalmente. Então, uma nova fé se estabeleceu; interna, silenciosa, mansa, profunda, acolhedora e terrivelmente verdadeira. Deus estivera sempre muito próximo. Eu é que não o percebia comigo. Faltava a minha contribuição. Dali por diante, todas as esperanças deveriam ser depositadas no altar pessoal interior e da luta persistente, e não mais na pedra fria do acaso e da acomodação. A estrada que me levaria aonde eu desejasse seria construída por mim. Eu me guiaria pelos meus propósitos mais íntimos, os únicos capazes de fazer suportar os tempos ruins. Foi ai que eu entendi que era só o começo, e que em mim acabara de abrir uma fresta que fez penetrar um tímido raio de saber sobre a minha imensa ignorância. Não tive dúvida, soube rapidamente que mal tinha aberto os olhos para uma vida maior e incomparavelmente melhor.

 *Armando Correa de Siqueira Neto é psicólogo (CRP 06/69637), palestrante, professor e mestre em Liderança. Coautor dos livros Gigantes da Motivação, Gigantes da Liderança e Educação 2006. E-mail: [email protected]

1 COMENTÁRIO

  1. Tão verdadeiro!!! Ainda bem que vc descobriu em tempo o que muitos Não conseguem a vida toda.
    Faço das tuas as minhas palavras. Percorri a mesma estrada, com consequencias e resultados similares.
    Muito bom para todos que tiverem a sorte de ler este artigo. Adorei!!!

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