O Brasil é hoje a sexta economia do mundo. No entanto, ocupa a 84ª
posição em Índice de Desenvolvimento Humano. Não somos um país da
contradição, mas, sim, da omissão. Pagamos os mais altos impostos e
recebemos os mais baixos serviços prestados pelos governos. Formamos
uma grande massa de silenciados da pátria, um “assombro de misérias e
grandezas”. Aqui, a parcela mais pobre e esquecida da sociedade
produz o maior espetáculo, o carnaval. Tudo para ser vivido fora,
debaixo dos holofotes das avenidas, bem distante de sua comunidade.
O que é a democracia senão o direito e o dever da minoria
representativa de fiscalizar e cobrar a maioria no parlamento? No
entanto, o que vemos nesta terra desde Cabral é a maioria silenciando
e cooptando a minoria e a minoria não buscando uma nova posição, não
apresentando um novo projeto de país, um novo caminho. Não querem
repensar o país, apresentar um programa de nação, mas sim um palanque
e a chance de reivindicar os privilégios que não tem. Não legislam
pela necessidade, mas pela conveniência.
Nossos grupos políticos não lutam por ideais, mas pela oportunidade de
administrar verbas, distribuir cargos, aparelhar o Estado, acertar
comissões. O caso das novas privatizações refletem bem essa realidade,
tão ultrapassado quanto atual em nossa política, que rasteja seu terno
surrado pelos corredores assombrados de nossa pobre vida diária. Está
nos jornais, nas capas de revistas, enquanto a família brasileira
assiste hipnotizada pela televisão a vida glamorosa que ela nunca
terá.
Enquanto no primeiro mundo, com todos seus privilégios e conquistas
sociais, o povo vai às ruas e protesta por uma política inclusiva e
mais humanizada, nós nos escondemos em casa, guardados por Deus,
voluntariamente refugiados. Alegam sermos um povo pacífico. Enquanto
isso, explode nos centros urbanos uma guerra surda, uma violência
desmedida, escancarada, de um povo fratricida. Em apenas um final de
semana, produzimos mais vítimas fatais em todo território nacional que
muitas guerras inteiras em países que vivem diariamente seus conflitos
sociais, ideológicos e raciais. Aqui, até nossa violência é covarde.
Não podemos confundir paz com passividade.
As greves, que deveriam ser um direito sagrado do trabalhador sem voz
e sem vez, é usada, manipulada, para garantir votos e eleições. Não é
a gestão para todos, mas para poucos. Governantes dizem com orgulho
que não toleram malfeitos, já antevendo a próxima crise. É a culpa que
condena. No entanto, aceitam como mérito o que não é feito. As
instituições nacionais estão em frangalhos, falidas, divididas e
repartidas. Não querem resolver os vários problemas, apenas
administrá-los, tendo a certeza de saber os números exatos e planos
complexos para a próxima campanha que já está sendo ensaiada. É a mão
que sufoca o novo, enquanto escorrer a esperança e os sonhos dos
brasileiros por entre os dedos.
Somos proprietários naturais das maiores reservas minerais do planeta.
No entanto, estamos privados de viver dessas benesses. Temos autonomia
em petróleo mas pagamos mais caro pela gasolina que países não
produtores. Entregamos nossos minerais a preço de banana podre e
depois compramos por muitas vezes mais o metal beneficiado, sem gerar
um só emprego.
Aqui as forças não convergem para que dessa estrutura possa nascer um
grande país. Mas divergem, cada uma apenas olhando para o melhor
quinhão que lhe cabe. Por isso se faz justificável a criação de tantos
órgão gestores e fiscalizadores, em uma triste constatação do dividir
para concentrar. É a organização de pequenos grupos gerindo o todo,
quando a Constituição proíbe a ação daquilo que é chamado de cartel.
Mais pela realização individualizada, desintegrada e dissociada da
população que pela ação do governo, vamos colhendo frutos de um povo
resignado e descomprometido, revelando que é capaz de produzir mas não
de administrar. Somos os braçais da globalização. Essa é nossa triste
realidade de um gigante adormecido, tendo seu berço esplêndido violado
todos os dias, enquanto ele prefere sonhar a viver. Somos um grande
país, mas ainda nos falta um grande povo.
Petrônio Souza Gonçalves é jornalista e escritor –
www.petroniogoncalves.blogspot.com