São valsas, polcas, tangos brasileiros – que abriram caminho para o choro – e diversos outros gêneros. Jacob do Bandolim (1918-1969), um dos mestres do choro, considerava Ernesto Nazareth o Chopin brasileiro. Guardião do acervo do compositor de Odeon e Apanhei-te Cavaquinho, o Instituto Moreira Salles (IMS) comemora o aniversário com dois eventos na cidade: um recital do pianista André Mehmari, hoje (19), às 20h, e um simpósio, amanhã (20) e quarta-feira (21), com quatro painéis, às 11h30 e às 15h30.
O Simpósio Ernesto Nazareth – 150 Anos reunirá especialistas brasileiros e estrangeiros na obra do compositor e será aberto ao público, com distribuição de senhas meia hora antes de cada mesa-redonda. Os ingressos para o recital estão à venda na sede do IMS, na Rua Marquês de São Vicente, 476, na Gávea, zona sul do Rio.
Além disso, o site www.ernestonazareh150anos.com.br, criado pelo IMS, que entrou no ar em 20 de março de 2012, dando início à contagem regressiva do sesquicentenário, traz novidades, como um depoimento de Jacob do Bandolim sobre Nazareth e informações sobre todos os eventos relacionados aos 150 anos do compositor.
O pesquisador Alexandre Dias é um dos coordenadores do site, que contém uma linha do tempo elaborada por Luiz Antonio de Almeida, biógrafo de Nazareth e herdeiro honorário do compositor. “Nazareth teve quatro filhos, mas nenhum neto. Diniz era o último filho que ainda estava vivo na década de 1980. Naquela época, Luiz Antonio, com apenas 14 anos, começou a pesquisar a vida do compositor e se tornou amigo de Diniz, que acabou doando a ele o acervo, adquirido anos depois pelo IMS”, conta Alexandre.
O site traz também uma discografia, que procura catalogar as gravações feitas no mundo inteiro das músicas do Nazareth. No momento, são mais de 2.700, das quais cerca de 2.300 estão disponíveis para serem ouvidas online, na íntegra. “Temos também toda a obra dele em partituras, para download na versão original, para solo de piano, e dezenas de músicas adaptadas para a versão em melodia e cifras. Isso facilita a leitura das partituras por grupos de choro”, explica o pesquisador.
Ernesto Nazareth nasceu em uma casa modesta, no bairro do Santo Cristo, na zona portuária do Rio. O pai era um ex-despachante aduaneiro e a mãe, pianista, foi a responsável por sua iniciação musical. Ele começou a compor aos 14 anos de idade e a primeira música, a polca-lundu Você Bem Sabe, foi dedicada ao pai.
“Nazareth começou a se apresentar profissionalmente em 1878. Nessa época, era o piano que mandava na cidade do Rio de Janeiro. A cidade chegou a ser chamada por um escritor de ‘pianópolis’. Para ouvir música, as famílias, mesmo as de poucos recursos tinham em casa um piano”, conta o biógrafo Luiz Antonio de Almeida.
Pianista profissional, Nazareth vivia de música, tocando em bailes, casamentos, batizados e cinemas, tanto nas salas de espera quanto acompanhando filmes mudos. “Quando surgiu o rádio, ele foi logo chamado para tocar em vários programas. Só entrou em declínio quando os pianistas começaram a ser substituídos pelas gravações”, diz Luiz Antonio, autor de uma biografia ainda não publicada, resultado de 37 anos de pesquisas.
As circunstâncias da morte do compositor continuam sendo um mistério. Vitimado pela surdez, que lhe causou perturbação mental, Nazareth acabou sendo internado, primeiramente no Instituto Neuro-Psiquiátrico, na Praia Vermelha, e depois na Colônia Juliano Moreira, em Jacarepaguá. Em fevereiro de 1934, saiu para um passeio pelas alamedas do sanatório e desapareceu. Depois de alguns dias, seu corpo foi encontrado nas águas de uma represa, na mata próxima à colônia. “Nazareth sofria de sífilis, que afetou seu sistema nervoso, causando a surdez”, informa o biógrafo.
No depoimento reproduzido no site, Jacob do Bandolim dizia não ter dúvidas de que foi mesmo suicídio. “Eu estive no local onde o corpo dele foi encontrado e cheguei à conclusão de que ele se suicidou mesmo, em um momento de lucidez da doença mental da qual ele sofria. Isso não foi dito porque na época não era elegante a notícia do suicídio de um membro de família reputada, como era a de Nazareth”, disse Jacob, entrevistado em 1965 pelo apresentador Glaucio Gill, em um programa de televisão.
De temperamento tímido e afetado pela surdez, Ernesto Nazareth não escondia sua amargura por não ser reconhecido como um compositor erudito, a exemplo de seu amigo Heitor Villa-Lobos. Segundo Luiz Antonio de Almeida, esse reconhecimento se dá hoje e cada vez mais internacionalmente. “Há milhares de estudantes de música em todo o mundo pesquisando a obra dele. Quando os chineses descobrirem o Nazareth, vamos ter outro planeta ouvindo e tocando sua música”, prevê.
Para Alexandre Dias, Ernesto Nazareth “fez uma confluência tão bem engendrada das vertentes erudita e popular” que a música dele serve tanto para concertistas de formação clássica quanto para músicos populares, das mais diversas formações. No blog do site, sob o título de Querido por Todos estão listadas as homenagens musicais que Nazareth recebeu. De um lado, Villa-Lobos, Camargo Guarnieri, Francisco Mignone e Marlos Nobre. De outro, instrumentistas como Armandinho e o sanfoneiro Dominguinhos.
Agência Brasil